REVISÃO DE OBRIGAÇÕES DURANTE A PANDEMIA

28 de abril de 2020 - Direito Civil

(Victor Leal)

Diante da pandemia ocasionada pela Covid-19, diversas medidas foram adotadas pelos governos federal e estaduais para conter o avanço da doença, o que têm gerado reflexos na esfera econômica e aumentado as incertezas quanto à possibilidade ou impossibilidade do cumprimento dos contratos já celebrados.

Por conta disso, importa relembrar alguns mecanismos jurídicos previstos na legislação aptos a mitigar riscos e penalidades a que estão sujeitos os contratantes em eventual descumprimento da avença.

Exemplificativamente, prevê o art. 393 do CC[1] a exclusão da responsabilidade do devedor pelo inadimplemento das obrigações em razão de eventos imprevisíveis e inevitáveis à época da celebração do contrato, gerando um impedimento real e comprovado da impossibilidade de seu cumprimento.

Ainda, em se tratando de contratos de execução continuada ou diferida, é prevista a possibilidade de resolução quando, para uma das partes, a situação se tornar onerosamente excessiva em razão de evento extraordinário e imprevisível que desequilibre a situação econômico-financeira que havia no início do contrato. Assim prevê o art. 478 do CC “nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato (…).

A propósito, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que “a intervenção do Poder Judiciário nos contratos, à luz da teoria da imprevisão ou da teoria da onerosidade excessiva, exige a demonstração de mudanças supervenientes das circunstâncias iniciais vigentes à época da realização do negócio, oriundas de evento imprevisível (teoria da imprevisão) e de evento imprevisível e extraordinário (teoria da onerosidade excessiva), que comprometa o valor da prestação, demandando tutela jurisdicional específica.[2]

Essas possíveis soluções demandam comprovação por parte do inadimplente quanto à impossibilidade de cumprimento da obrigação previamente acertada em virtude dos impactos ocasionados pela pandemia, não bastando uma mera alegação genérica.

Partindo de tais premissas, já existem julgados sobre revisão judicial de contratos na pandemia de Covid-19 pela teoria da imprevisão. O Desembargador José Eustáquio de Castro Teixeira, integrante da 8ª Turma Cível do E.TJDFT, deixou consignado, em síntese, que entra em ação o Princípio da Imprevisão, autorizando-se a modulação das obrigações quando evento externo, imprevisível, ataca a relação jurídica e a torna difícil de ser executada para um dos seus polos. Dependendo da situação, portanto, poderá o Juiz relativizar o cumprimento da obrigação, preservando até mesmo o próprio Contrato, pois a sua não relativização levaria ao rompimento da relação jurídica, prejudicando o próprio credor”.

Portanto, embora exista possibilidade de revisão das obrigações em razão da imprevisibilidade dos efeitos causados pela Pandemia de Covid-19, será necessária análise de cada caso concreto, já que a flexibilização dos termos pactuados não pode ser vista como um salvo conduto para inadimplemento generalizado.


[1] Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

[2] REsp 1321614/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Rel. p/ Acórdão Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/12/2014, DJe 03/03/2015. Destaques nossos.