A PEJOTIZAÇÃO NO ALVO DA RECEITA FEDERAL

22 de outubro de 2020 - Direito Público

(Franciele Silva)

A Receita Federal tornou público seu Plano Anual de Fiscalização para 2020, no qual estabelece estratégias para garantir a correta arrecadação de tributos pelos contribuintes. Consta no plano da administração fazendária uma possível intensificação dos processos de fiscalização, sobretudo sobre as operações-alvo do órgão administrativo.

Dentre essas operações está a utilização indevida da chamada “pejotização”, prática que, para relações trabalhistas, compreende a contratação de funcionários (pessoas físicas) mediante a constituição irregular de pessoa jurídica para a diminuição dos encargos inerentes à relação empregatícia.

Diante desse cenário, é importante ter em mente que é lícita a contratação de profissional que preste seus serviços sob a forma de pessoa jurídica. A irregularidade consiste nos casos em que a constituição da personalidade jurídica é simulada apenas para reduzir a carga tributária.

Enquanto na esfera trabalhista eventual irregularidade conduz ao reconhecimento do vínculo empregatício e do pagamento das verbas correlatas, na esfera tributária, a pessoa jurídica contratada pode vir a ser desconsiderada pela Receita Federal, com a lavratura de auto de infração para a cobrança dos valores não recolhidos a título de contribuições previdenciárias e, a depender das circunstâncias, da glosa de créditos da contribuição ao PIS e da COFINS eventualmente apropriados no regime não cumulativo das contribuições sociais.

Isso ocorre porque o art. 116, p. único e art. 149, inc. VII do CTN estabelecem que a auditoria fiscal tem o dever de fiscalizar e identificar os negócios jurídicos de acordo com a situação fática, a despeito dos aspectos meramente formais. Ou seja, o que vale para a fiscalização é o verdadeiro relacionamento das partes envolvidas (empresa – empresa/empresário individual ou empresa – funcionário), e não a maneira pelas quais foram constituídas formalmente.

O ponto central dessa temática está nas circunstâncias fáticas e no conjunto probatório. Apesar de existirem possíveis indícios de subordinação e das demais características trabalhistas, a linha entre a relação empregatícia e o contrato de prestação de serviços muitas vezes pode ser tênue, de modo que a conclusão de que houve, em verdade, relação de emprego, deve ser comprovada pela Receita Federal caso pretenda desconsiderar a forma original do negócio jurídico.

É indispensável, portanto, que a fiscalização evidencie, mediante provas constituídas, a presença de todos os elementos identificadores do vínculo trabalhista, conforme previsto no art. 12 da Lei nº 8.212/1991 e art. 3º da CLT.

Não é demais reforçar que a ilicitude da conduta do contribuinte não pode ser presumida. É por meio das provas, cuja constituição é dever da própria fiscalização, que será possível considerar, ou não, a irregularidade da contratação.

Eventual desconsideração das atividades deve sempre ser acompanhada de indícios concretos, e não meras suposições, a construção lógica que permita compreender a nova qualificação jurídica dos negócios e operações realizadas.