INDENIZAÇÃO POR RESCISÃO IMOTIVADA DE CONTRATO DE REPRESENTAÇÃO NÃO PODE SER ANTECIPADA

03 de março de 2020 - Direito Administrativo

(Leonardo Matos)

Os contratos de representação comercial são um instrumento de grande valia para o desenvolvimento das atividades empresariais no Brasil, em razão da redução de custos que este tipo de contratação oferece quando comparados com outras formas de contratação.

Por meio de um contrato de representação, um representante se compromete a promover a venda de produtos e angariar clientes para a empresa representada, agindo em seu nome e por conta desta. O representante fica responsável por repassar os pedidos dos clientes, sendo remunerado mediante comissão sobre o valor das vendas que realiza.

No Brasil, a atividade dos representantes comerciais autônomos é regulamentada pela Lei n. 4.886/1965, a qual define as diretrizes para o exercício da atividade e traz consigo normas protetivas, que objetivam equilibrar a relação existente entre representante e representada.

O art. 27 da referida lei estabelece alguns requisitos mínimos, obrigatórios, que devem constar em um contrato de representação comercial, dentre os quais, se encontra a necessidade da estipulação de uma indenização a ser paga ao representante em caso de rescisão imotivada por iniciativa da representada, que não pode ser inferior a 1/12 (um doze avos) da retribuição auferida pelo representante durante o tempo em que a representação foi exercida (art. 27, alínea “j”, da Lei n. 4.886/1965).

Ocorre que muitos contratos de representação se prolongam por anos, de forma que estas indenizações, não raras vezes, alcançam valores bastante elevados, gerando um grande passivo para as empresas nas hipóteses de rescisão imotivada dos contratos (quando estas partem de sua iniciativa).  Levando isto em consideração, muitas empresas passaram a optar pela antecipação dessa indenização, diluindo-a junto com o regular pagamento das comissões dos representantes. Esta forma de contratação acabou gerando uma discussão acerca da sua validade, discussão esta que chegou até o Superior Tribunal de Justiça para ser analisada e julgada.

Ao julgar o Recurso Especial n. 1831947/PR, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, a Terceira Turma do STJ adotou o entendimento de que a norma em questão objetiva a proteção do representante comercial que, sem justo motivo, sofre prejuízos com a perda repentina de sua atividade habitual e da clientela que angariou ao longo do tempo, lhe permitindo assim, o reequilíbrio da sua situação econômico-financeira. O julgamento ainda contou com o voto divergente do Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, o qual entendeu que a relação existente entre representante e representada, no caso, não demonstrava uma preponderância do poder da representada sobre a empresa representante, não sendo identificada qualquer situação de vulnerabilidade na relação, de forma que não haveria justificativas para um tratamento jurídico diferenciado à empresa representante, devendo ser respeitada a autonomia da vontade das partes e a sua liberdade para contratar.

O Ministro também ponderou que, embora a norma discutida não preveja o pagamento antecipado de indenização, também não a proíbe. Acrescentou ainda que, após anos de desenvolvimento da relação contratual, já havia sido estabelecida uma confiança legítima no que diz respeito à retidão do comportamento adotado pelas contratantes.

Contudo, prevaleceu na turma o entendimento da relatora, de que a Lei 4.886/65 é um diploma normativo em que se observa nitidamente o intuito protetivo conferido pelo legislador, tendo o escopo de equilibrar a relação jurídica entre as partes, impondo limitações à autonomia da vontade dos contratantes.

Assim, cláusula contratual que prevê o pagamento diluído e antecipado da indenização é nula, pois desvirtua a finalidade da indenização e, de modo que, mesmo tratando-se de contratos de natureza empresarial, os contratos de representação comercial devem estar “ajustados à principiologia que os rege e aos comandos legais obrigatórios incidentes, sob pena de, não o fazendo, estarem sujeitos à declaração de nulidade de suas cláusulas”.

Desta feita, conclui-se que o pagamento da indenização não pode ser antecipado, devendo acontecer apenas após a ocorrência do fato que a origina, no caso, a rescisão imotivada que parte da representada, sob pena de serem reputados inválidos os pagamentos antecipados.