RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA E CIVIL DA PESSOA JURÍDICA PELA PRÁTICA DE ATOS CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E O PROGRAMA DE COMPLIANCE

16 de agosto de 2016 - Direito Administrativo - Direito Civil
Em resposta às manifestações populares, o Congresso aprovou a primeira lei no País que estabelece a responsabilidade civil e administrativa das pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública (Lei 12.846/2013). A lei que entrou em vigor em 29.01.2014 é extremamente rigorosa com os empresários, permitindo, por exemplo, uma punição administrativa prévia à judicial.
      A norma proíbe o seguinte: a) Prometer ou oferecer vantagens indevidas a agente público nacional ou estrangeiro; b) Fraudar licitações; c) Fraudar contratos públicos; d) Utilizar “laranjas”; e e) Dificultar as investigações ou fiscalizações dos órgãos públicos. Seus efeitos se estendem às sociedades empresárias e simples, fundações, associações e sociedades estrangeiras
      As punições administrativas consistem em multa de 0,1% a 20% do faturamento bruto da empresa ou, na hipótese de não ser possível aferi-lo, no valor de até R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais). A decisão condenatória será divulgada na internet e em meios de comunicação de grande circulação, além de fixação de um edital no estabelecimento comercial da pessoa jurídica punida, às expensas do próprio condenado. Essas sanções não eximem a pessoa jurídica de ressarcir o prejuízo sofrido.
      Já as penalidades judiciais são a proibição de receber incentivos fiscais pelo prazo de até 5 (cinco) anos, suspensão da atividade empresarial e a dissolução compulsória da pessoa jurídica.
      Ademais, as pessoas jurídicas serão investigadas sob a ótica da Responsabilidade Objetiva, ou seja, não será necessário comprovar dolo ou culpa. Basta existir correlação entre o dano e o fato apontado, fragilizando significativamente a defesa das empresas.
      Uma forma de atenuar o rigor dessa lei é a implementação do programa de Compliance. Essa disposição está contida no Art. 7º, VII da referida lei, que também traz uma breve síntese desse instituto: “procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica”.
      O termo compliance tem origem na língua inglesa como derivação do verbo to comply, que, em síntese, significa agir de acordo com a regra. Originalmente, os programas de compliance foram desenvolvidos para instituições financeiras nos Estados Unidos em 1913. Na época, seu objetivo era regulamentar o sistema financeiro para torná-lo mais flexível, seguro e estável[1]. Com o tempo estes programas foram se estendendo aos mais diversos setores da economia.
      Atualmente existem diversos conceitos para o termo, como aquele desenvolvido pelo Coordenador da 3ª Câmara de Coord. e Revisão do Ministério Público Federal (MPF), Antônio Fonseca: “Usualmente definido como o conjunto de práticas que têm como objetivo garantir a conformidade dos atos da organização às leis, às políticas, e às diretrizes, o compliance tem sido defendido por Fonseca como instrumento de resgate da responsabilidade social das pessoas jurídicas de direito privado.”[2]
      Nota-se como o texto legal e o conceito ora posto pelo integrando MPF são precipuamente regulamentares. Tanto é assim que o parágrafo único do artigo  7º estabelece que o Poder Executivo deverá regulamentar os códigos de ética e procedimentos a serem desenvolvidos.
      Portanto, assim como em sua origem, o conceito de compliance trazido pela lei parte do ponto de vista de regulamentação de condutas. No entanto, o compliance atualmente é concebido como mais do que meras regras de conduta. Sua aplicação nas empresas visa também reduzir fraudes internas, erros de procedimento e otimizar atividades. Ou seja, regulamentar condutas do ponto de vista moral, também com base em um regulamento interno e não somente na legislação (externo).
      Nesse sentido, estudo da Associação Brasileira de Bancos (como visto, setor onde há forte investimento em compliance) define que “compliance é o dever de cumprir, estar em conformidade e fazer cumprir regulamentos internos e externos impostos às atividades da instituição.”[3]
      Em relação às normas internas, é oportuno destacar que o compliance pode reduzir o índice de fraudes e erros prejudiciais à companhia, ao estabelecer regras morais e aprimorar o controle sobre as atividades dos colaboradores.
      Segundo estudo da Association of Certified Fraud Examiners[4], fraudes internas em empresas tem o potencial de gerar um benefício econômico ao criminoso quase dez vezes superiores a um roubo a banco, com chance muito superior de não ser descoberta, tampouco punida. Essa é uma das razões pela qual outros estudos apontam que o investimento em compliance pode trazer um benefício de cinco vezes a quantia despendida para sua criação e aprimoramento.
      Assim, a implementação do compliance torna-se altamente recomendável às empresas brasileiras, seja para atenuar a severa responsabilidade atribuída pela lei, seja para a prevenção de riscos.
[1] SANTOS, Renato Almeida dos; GUEVARA, Arnoldo José de Hoyos; AMORIM, Maria Cristina Sanches; FERRAZ-NETO, Ben-Hur. Compliance e liderança: a suscetibilidade dos líderes ao risco de corrupção nas organizações. 2012.
 [2]  Disponível em http://noticias.pgr.mpf.mp.br/noticias/noticias-do-site/copy_of_consumidor-e-ordem-economica/3a-camara-do-mpf-debate-compliance-a-luz-a-lei-anticorrupcao-1. Acesso em 25 de setembro de 2013.
[3] Disponível em: http://www.abbi.com.br/download/funcaodecompliance_09.pdf. Acesso em 25 de setembro de 2013.
 [4] Association of Certified Fraud Examiners. Fraud examiners manual. 3rd ed. Austin: ACFE; 1993. Apud Compliance e liderança: a suscetibilidade dos líderes ao risco de corrupção nas organizações. 2012.