STJ CRIA O “INVENTARIANTE DIGITAL” PARA CUIDAR DE BENS E DADOS DE PESSOAS QUE FALECERAM

22 de outubro de 2025 - Direito Civil

(Renata Siqueira Seixas)

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tomou uma decisão inédita ao criar a figura do “inventariante digital”, que nada mais é do que uma pessoa nomeada pela Justiça para ajudar no processo de inventário quando há bens armazenados em dispositivos eletrônicos — como celulares, tablets e computadores — de alguém que faleceu.

A decisão foi tomada pela Terceira Turma do STJ, durante o julgamento de um caso em que seis membros de uma mesma família morreram em um acidente aéreo em São Paulo, em 2016. Os herdeiros queriam acessar três tablets das vítimas para descobrir se havia bens digitais — como fotos, arquivos, senhas ou valores guardados em plataformas online — que pudessem fazer parte da herança.

Durante o julgamento, a ministra Nancy Andrighi destacou que a simples abertura de dispositivos eletrônicos de uma pessoa falecida pode expor dados pessoais e sigilosos, como conversas privadas, fotos e senhas.

Por isso, ela propôs que a Justiça crie um procedimento específico para identificar bens digitais, com a ajuda de um inventariante digital, que terá dever de sigilo e poderá ser responsabilizado civil e criminalmente caso viole informações pessoais.

Assim, o inventariante digital atuará como uma espécie de perito, com conhecimento técnico, nomeado pelo juiz. Ele terá a função de acessar os aparelhos eletrônicos apenas para identificar bens que possam ser transmitidos aos herdeiros, sem revelar mensagens, fotos pessoais ou outros dados íntimos.

De acordo com a ministra Nancy Andrighi, que foi a relatora do caso, o objetivo é proteger a privacidade das pessoas falecidas e evitar o acesso irrestrito a informações pessoais por parte de familiares, juízes ou empresas de tecnologia. “O inventariante digital apenas ajuda o juiz, usando conhecimento técnico, a identificar o que faz parte da herança e o que deve permanecer em sigilo”, explicou.

A proposta foi aprovada pelos ministros Humberto Martins, Moura Ribeiro e Daniela Teixeira. Apenas o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva discordou, entendendo que o próprio Judiciário poderia autorizar o acesso às informações, sem demandar a nomeação do inventariante.

Essa decisão é considerada um marco importante no Brasil, pois abre caminho para uma regulamentação da herança digital, tema que ainda não tem uma lei específica no país.