Falta de clareza em cláusula de contrato de seguro desrespeita o CDC

23 de março de 2021 - Direito Civil

(Leonardo Matos) 

O Código de Defesa do Consumidor elenca, em seu artigo 6º, uma série de direitos básicos dos consumidores, dentre eles, o direito à informação (art. 6º, III, CDC[1]). E quando existe alguma cláusula que exclui a cobertura de indenização securitária em caso de furto simples, ela pode ser considerada abusiva quando o contrato não é suficientemente claro.

Esse dispositivo consagra o dever de o fornecedor prestar, de forma clara, precisa e acessível, todas as informações relacionadas ao produto ou serviço que oferece.

O § 4º do artigo 54 da legislação consumerista reforça essa obrigação, ao determinar transparência e clareza nos contratos de adesão: “As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão”.

O desrespeito a essas obrigações pode implicar no reconhecimento da abusividade de determinadas cláusulas contratuais, gerando a obrigação para o fornecedor de arcar com gastos pelos quais não teria inicialmente se obrigado.

Para exemplificar as consequências práticas da inobservância da norma, pode-se citar o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, que entende serem abusivas as cláusulas de contratos securitários que excluem da cobertura os prejuízos decorrentes de furtos simples, sem deixar claro para o consumidor o que isso significa.

Em termos práticos, o furto simples ocorre quando alguém subtrai coisa móvel pertencente a outrem (art. 155, CP[2]). Já o furto qualificado ocorre quando o crime é cometido com o uso de chave falsa, destruição ou rompimento de obstáculo, abuso de confiança, com a participação de mais pessoas, ou ainda, mediante fraude, escalada, destreza (art. 155, §4º CP[3]). O roubo, por sua vez, se caracteriza pelo emprego de violência ou grave ameaça no cometimento do crime.

Entretanto, o consumidor médio nem sempre saberá diferenciar ou interpretar termos técnicos como estes citados. Por essa razão, se o contrato não estiver redigido com uma linguagem acessível e suficientemente clara, as cláusulas que contiverem redações dúbias serão interpretadas em seu benefício, podendo até mesmo serem declaradas nulas.

Nessas situações, a jurisprudência[4] tem declarado que essas cláusulas são nulas, por violação do dever de informação, implicando no dever de as seguradoras indenizarem seus clientes também nos casos de furtos simples.

Conclui-se então que, não basta que as cláusulas estejam redigidas de forma legível e ostensiva, mas é essencial que o seu conteúdo esteja suficientemente claro para o consumidor final médio, a fim de evitar a sua possível invalidação em juízo posteriormente.


[1] “Art. 6º São direitos básicos do consumidor: […] III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”.

[2] “Art. 155 – Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel”.

[3] “Art. 155, § 4º – A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido: I – com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa; II – com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza; III – com emprego de chave falsa; IV – mediante concurso de duas ou mais pessoas.”

[4] v.g.: REsp 1837434/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 03/12/2019, DJe 05/12/2019.