ORÇAMENTO DE GUERRA NA PANDEMIA: MEDIDAS APROVADAS PARA O GOVERNO FEDERAL E PARA O BANCO CENTRAL

26 de junho de 2020 - Direito Constitucional - Direito Financeiro

(Murilo Varasquim)

A Emenda Constitucional 106/2020 institui regime extraordinário fiscal, financeiro e administrativo para enfrentamento da pandemia. Trata-se da “Emenda do Orçamento de Guerra” e foi promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal[1].

O texto traz medida excepcional, que acarreta a segregação momentânea do orçamento para enfrentar a crise do coronavírus.

Pois bem. A Emenda trabalha em quatro principais frentes de combate:

  1. Ficaram autorizados processos simplificados de contratação de pessoal e de obras, serviços e compras sem a necessidade de prévia dotação orçamentária suficiente, tampouco de autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias;
  2. Em exceção à norma do § 3º do art. 195 da Constituição Federal, pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social poderá contratar com o Poder Público, bem como receber benefícios ou incentivos fiscais;
  3. O art. 4º da EC dispensa o Poder Executivo de obedecer a chamada “regra de ouro das finanças públicas” (art. 167, III, da Constituição Federal).[2]
  4. Ampliação dos poderes do Banco Central para comprar e vender títulos públicos e ativos no mercado secundário.[3]

Dentre todas essas medidas, chamou bastante a atenção dos analistas de mercado o fato de que a Emenda modificou a capacidade do BACEN de atuar no sistema financeiro ao conceder à autarquia o poder de negociar títulos privados (debêntures, por exemplo) no mercado secundário.

De fato, trata-se de significativa novidade quanto às competências do BC. Contudo, isso expõe o Banco Central e, em última análise, o próprio Tesouro Nacional, ao risco de calote, sobretudo em caso de aquisição de “títulos podres”.[4]

Se a pandemia exige o aumento do gasto público, desnecessário detalhar, por outro lado, que todas essas outras novas medidas aprovadas tendem a castigar mais uma vez o debilitado orçamento da União[5], desequilibrando ainda mais as contas públicas.


[1] Diário Oficial da União de 08/05/2020. Texto aprovado disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc106.htm#art11. Acesso em 21/06/2020.

[2] “Art. 167. São vedados:

III – a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta;”

[3] Mercado secundário é “o local onde os investidores negociam e transferem entre si os valores mobiliários emitidos pelas companhias. Nesse mercado ocorre apenas a transferência de propriedade e de recursos entre investidores. A companhia não tem participação. Portanto, o mercado secundário oferece liquidez aos títulos emitidos no mercado primário.” Informação disponível em https://www.investidor.gov.br/menu/Menu_Investidor/funcionamento_mercado/mercado_primario.html. Acesso em 21/06/2020.

[4] Informação disponível em: https://valorinveste.globo.com/produtos/renda-fixa/debentures-e-divida-privada/noticia/2020/04/15/entenda-a-compra-de-titulos-pelo-banco-central-proposta-no-orcamento-de-guerra.ghtml. Acesso em 21/06/2020.

[5] Informação disponível em: https://www.infomoney.com.br/mercados/guedes-se-pec-emergencial-for-aprovada-em-24h-voucher-sai-em-24h/. Acesso em: 21/06/2020.