(Paula Helena Carvalho)
Segundo o Código de Defesa do Consumidor (CDC), a venda casada é uma prática abusiva definida como o ato de “condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço” (art. 39, I do CDC).
E, nessa esteira, a prática da venda de aparelhos celulares sem seus respectivos adaptadores de energia, ou carregadores, é fruto de muita controvérsia sobre ensejar, ou não, referida ilicitude de forma indireta. E isso porque o dispositivo de recarga é indispensável para o uso do aparelho, de modo que é obrigatória a sua aquisição.
Atentando contra a boa-fé objetiva e as boas práticas comerciais e corrompendo a liberdade de escolha do consumidor, a jurisprudência dominante muito facilmente constata a prática da ilicitude. Afinal, “a política comercial da fabricante e fornecedora de smartphone de, oferecendo produto novo com acervo tecnológico substancial agregado, (…) sem que disponibilize completo sistema de carregamento, demandando a aquisição de acessório complementar, preferencialmente de sua fabricação própria, (…) não se afigura legítima, pois implica a dependência do consumidor à detenção ou aquisição de produto secundário como condição para fruir plenamente do produto principal que adquirira (…)[1]”.
E é com base nesse mesmo entendimento que a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) instaurou procedimento sancionatório contra a Xiaomi, Samsung, Asus, LG e Motorola.
Agora, a afetada é a Apple. A desembargadora federal Daniele Maranhão, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), determinou, em março de 2023, a manutenção da suspensão de venda de iPhones no Brasil enquanto a empresa não fornecer os dispositivos de carregamento acompanhados nos aparelhos de celular.
A desembargadora fundamentou sua decisão do Agravo de Instrumento n. 1001830-13.2023.4.01.0000 especialmente no fato de que a empresa “não manifestou interesse em adotar medidas para sanar as irregularidades apontadas, ou seja, oferecer carregadores de tomada aos consumidores”, como teriam feito suas concorrentes.
Muito embora pendente de recurso, a empresa já teve seu pedido de efeito suspensivo indeferido, de modo que a decisão está em vigor, nos moldes originalmente determinados pela Senacon.
[1] Acórdão 1437886, 07324123620218070001, Relator: TEÓFILO CAETANO, Primeira Turma Cível, data de julgamento: 20/7/2022, publicado no DJe: 8/8/2022