INÍCIO DO PRAZO PARA O EXERCÍCIO DO DIREITO DE PREFERÊNCIA PELO CONDÔMINO PRETERIDO

25 de janeiro de 2021 - Direito Civil

(Leonardo Matos)

Quando uma coisa pertencer há mais de uma pessoa, cabendo a cada uma delas o mesmo direito sobre o todo e suas partes, de acordo com a fração que lhe pertence, estar-se-á diante da figura do condomínio.

O Código Civil brasileiro prevê em seu art. 504 o direito de preferência dos condôminos, que poderá ser exercido sempre que um condômino pretender vender a fração que lhe pertença de coisa comum indivisível.

Dispõe o referido artigo que: “Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência.”.

Assim, se um dos donos de um imóvel, por exemplo, pretende vender a fração ideal que lhe cabe desse imóvel a qualquer terceiro que não seja um condômino, antes de concretizar o negócio deverá comunicar o(s) outro(s) condômino(s) acerca da sua pretensão, para que digam se pretendem exercer o seu direito de preferência.

Esse direito assegura ao condômino a aquisição da fração ideal que está sendo alienada, desde que respeitadas as mesmas condições do negócio a ser celebrado com o terceiro. Isto é, à mesma proposta feita ao terceiro, o condômino terá não apenas direito, mas a preferência para fechar o negócio.

No entanto, pode ocorrer de a venda ser concretizada com um terceiro sem que o condômino tome conhecimento imediato, sendo assim preterido no seu direito.

Por essa razão, o referido dispositivo do Código Civil prevê a possibilidade desse condômino exercer o seu direito de preferência, devendo para tanto, concordar com as condições do negócio celebrado e depositar o preço do negócio.

No entanto, o art. 504 do Código Civil estabelece um prazo decadencial para o exercício desse direito, que é de 180 (cento e oitenta) dias, contados da data em que o condômino preterido tomar conhecimento do negócio. O conhecimento ao qual a lei se refere é a ciência inequívoca da venda e dos termos do negócio. É a partir daí que o prazo para o exercício do direito começará a decorrer.

Assim, o início do prazo pode variar muito de caso para caso. O conhecimento dessas informações pode advir de uma notificação formal ou até mesmo informal (que deverá ser devidamente comprovada).

Todavia, há casos em que a comunicação não é feita nem por uma forma, nem por outra. Nesses casos, entende-se que o prazo começará a correr a partir do registro da escritura pública de compra e venda na matrícula do imóvel perante o Ofício de Registro de Imóveis competente.

Isso se deve porque com o registro o ato se torna público, surtindo efeitos não mais apenas em relação às partes do negócio, mas a toda a coletividade, sendo presumida a ciência do negócio.

Recentemente o Superior Tribunal de Justiça reafirmou esse entendimento, ao julgar o Recurso Especial n. 1.628.478/MG, que ficou assim ementado:

“RECURSO ESPECIAL. CIVIL. VENDA DE QUINHÃO DE COISA COMUM INDIVISA. DIREITO DE PREFERÊNCIA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. INOBSERVÂNCIA AO DIREITO DE PREEMPÇÃO DOS DEMAIS CONDÔMINOS. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. CIÊNCIA INEQUÍVOCA QUE SE DEU APENAS COM O REGISTRO DA ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA. DISSONÂNCIA ENTRE O PREÇO DO NEGÓCIO E AQUELE ESTAMPADO NO TÍTULO TRANSLATIVO REGISTRADO EM CARTÓRIO. PRÁTICA DE PREÇO SIMULADO. ABUSO DO DIREITO. OFENSA À BOA-FÉ OBJETIVA. PREVALÊNCIA DO DOCUMENTO LAVRADO PELO TABELIÃO E LEVADO A REGISTRO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. O propósito recursal consiste em definir, além da negativa de prestação jurisdicional: i) a forma pela qual deve se dar a notificação que viabilize o direito de preferência do condômino na aquisição de parte ideal de coisa comum indivisa; e ii) o parâmetro do valor do negócio a ser considerado para tal fim.

2. Verifica-se que o Tribunal de origem analisou todas as questões relevantes para a solução da lide, de forma fundamentada, não havendo falar em negativa de prestação jurisdicional.

3. Nos termos do art. 504 do CC/2002, é garantido ao condômino o direito de preferência na aquisição de fração ideal de coisa comum indivisa, em iguais condições ofertadas ao terceiro estranho à relação condominial, desde que o exerça no prazo de 180 (cento e oitenta) dias a contar da ciência. Tal conhecimento deve ser possibilitado pelo coproprietário alienante, em decorrência de imposição legal, através de prévia notificação, judicial, extrajudicial ou outro meio que confira aos demais comunheiros ciência inequívoca da venda e dos termos do negócio, consoante o previsto nos arts. 107 do CC/2002 e 27, in fine, da Lei n. 8.245/1991, este último aplicado por analogia.

4. Aperfeiçoada a venda (no caso imobiliária) ao terceiro, com a lavratura de escritura pública e o respectivo registro no Cartório de Registro de Imóveis, sem a devida observância ao direito de preempção, surge para os coproprietários preteridos o direito de ajuizamento de ação anulatória ou de direito de preferência c/c adjudicação compulsória, desde que o faça dentro do prazo decadencial de 180 (cento e oitenta) dias, contados do registro da escritura, cuja publicidade implica a presunção de ciência acerca da venda e das condições do negócio estampadas no título.

5. Praticado preço simulado pelas partes, fazendo constar da escritura pública preço a menor, que não reflita o valor real do negócio, deve prevalecer aquele exarado na escritura devidamente registrada para fins do direito de preferência, sendo que o registro do título (que tem como atributo dar publicidade da alienação imobiliária a toda a sociedade, conferindo efeito erga omnes) é o ato substitutivo da notificação, que deveria ter sido anteriormente remetida ao coproprietário, mas não foi, não podendo o condômino alienante valer-se da própria torpeza, a qual denota o abuso do direito infringente da boa-fé objetiva.

6. Recurso especial conhecido e desprovido.”[1]

Com base nessas breves exposições, pode-se concluir que, é do interesse não apenas do condômino que pretenda alienar a fração ideal do imóvel que lhe pertença, mas principalmente do adquirente, que seja respeitado o direito de preferência do(s) condômino(s) preteridos, sob pena de o negócio ser prejudicado, caso este último decida exercer o seu direito de preferência.

É possível concluir também que, do ponto de vista do condômino preterido, havendo o registro da alienação perante o registro de imóveis, o prazo decadencial de 180 (cento e oitenta dias) começará a correr a partir desta data (salvo se já tiver sido comunicado acerca do negócio e dos seus termos em data anterior), evento para o qual deverá estar sempre atento.


[1] REsp 1628478/MG, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 03/11/2020, DJe 17/11/2020.