Devolução de ICMS na Conta de Energia Elétrica: STF Consolida Direito dos Consumidores e Fixa Prazo Decenal para Restituição

(Jennifer Michelle dos S. Souza)

O Supremo Tribunal Federal (STF), em recente julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 7.324, validou integralmente a Lei Federal nº 14.385/2022, que determina a devolução aos consumidores dos valores de ICMS[1] indevidamente incluídos na base de cálculo do PIS e da COFINS[2] nas tarifas de energia elétrica. A decisão, proferida em agosto de 2025, encerra um longo debate tributário e regulatório que envolvia as distribuidoras de energia, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e milhões de consumidores em todo o país.

A controvérsia tem origem no entendimento do próprio STF, firmado em 2017, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 574.706/PR (Tema 69 da Repercussão Geral), de que o ICMS não integra a base de cálculo do PIS e da COFINS. Como o valor do imposto é repassado aos consumidores na fatura mensal, sua exclusão das bases de cálculo gerou créditos bilionários a serem restituídos pela União às concessionárias. Surgiu, então, a controvérsia sobre quem seria o legítimo beneficiário desses valores: as distribuidoras, que ajuizaram as ações, ou os consumidores, que suportaram o ônus econômico.

Com a edição da Lei nº 14.385/2022 foi solucionada a questão ao atribuir à ANEEL a competência para disciplinar o repasse dos valores, determinando que os montantes reconhecidos judicial ou administrativamente sejam devolvidos integralmente aos consumidores. As distribuidoras contestaram a norma sob alegação de violação ao direito de propriedade e à isonomia tributária, mas o STF considerou a lei constitucional, reconhecendo que a devolução possui natureza regulatória e consumerista, e não tributária

O Supremo fixou ainda prazo prescricional de 10 (dez) anos para que os consumidores reivindiquem os valores, contado a partir da data em que a distribuidora obtiver o ressarcimento – seja por restituição direta, seja por compensação homologada, bem como definiu que as distribuidoras poderão deduzir apenas tributos incidentes e honorários advocatícios diretamente vinculados à recuperação dos créditos, sendo vedada qualquer retenção adicional.

Na prática, a decisão consolida o entendimento de que o benefício econômico pertence ao consumidor final, responsável pelo pagamento das faturas de energia. A devolução será operacionalizada por mecanismos tarifários definidos e homologados pela ANEEL, usualmente mediante descontos nas contas de luz, em cronogramas já observados em anos anteriores.

Para o setor empresarial, a medida é relevante especialmente para empresas de grande consumo energético, como indústrias, incorporadoras e centros comerciais, que podem ter valores expressivos a recuperar. O julgamento representa oportunidade de revisão e auditoria das faturas de energia, a fim de verificar se os repasses foram integralmente aplicados e, se necessário, adotar medidas administrativas ou judiciais para a restituição complementar dentro do prazo decenal.

A decisão também encerra uma fase de incerteza para as distribuidoras, permitindo a regularização contábil e a previsibilidade tarifária. Para os consumidores, reafirma os princípios da legalidade tributária, da modicidade tarifária e da proteção do consumidor, fortalecendo a coerência do sistema jurídico e regulatório.

Diante disso, recomenda-se que empresas e consumidores mantenham acompanhamento jurídico especializado, tanto para identificar créditos passíveis de restituição quanto para garantir o correto cumprimento das devoluções determinadas pela ANEEL e reconhecidas pelo ST, através ajuizamento tempestivo de eventuais ações de repetição de indébito ou requerimentos administrativos junto à ANEEL e às distribuidoras locais.


[1] ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), tributo de competência estadual, cobrado sobre diversas operações e serviços. 

[2] PIS (Programa de Integração Social) e COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) são contribuições federais cobradas das empresas com base em seu faturamento, destinadas a financiar a Seguridade Social, que abrange Previdência, Saúde e Assistência Social.